Poliscivita


POLISCIVITA é um blog que trata da filosofia geral, da filosofia jurídica e da sociologia de forma interdisciplinar. Junte-se a nós com seus comentários pertinentes.


quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

A NATUREZA DO VALOR

Tipos de valor
Axiologia é o estudo dos valores. Possui três questões fundamentais: 1. natureza (valores são objetivos ou subjetivos, pessoais ou impessoais?), 2. tempo (valores são variáveis ou constantes?), 3. importância (existem hierarquia de valores?).
1. Valores objetivos existem independente dos sentimentos. São da própria natureza do universo. São ontológicas (próprios do ser humano). Ex. a beleza intrínseca do pôr-do-sol. Os subjetivos relacionam-se com o desejo pessoal, de criação humana.
2. Valores absolutos são constantes, não mudam com o passar do tempo. Os transitórios são reações às necessidades do homem. São mais sociais. Costumes e valores de uma tribo são diferentes de um urbano; o valor “moral”: o que antes era considerado imoral, hoje não o é.
3. A hierarquia de valores depende de cada um de nós, pois somos nós que a fazemos. Quais são mais importantes? Os valores religiosos, empíricos, etc.? O que o homem aprecia pode ser diferente do que eles dizem apreciar. Ex. políticos que mentem quando dizem que apreciam a honestidade.

Ética
É a conduta moral. Valores corretos para ações corretas. Dois tipos de teoria ética: intuicionismo e naturalismo. O primeiro declara que valores morais são diretamente apreendidos. O segundo, o homem é o originador e a medida de seus próprios valores. Exemplo: relações sexuais pré-maritais.

Estética
Relaciona-se com beleza e arte e inclina-se para um critério mais pessoal. A arte deve ser imitativa ou representativa? Artista quer liberdade. Arte que não consegue comunicar sua mensagem não pode ser autêntica. Artista pode não ser reconhecido em sua época, e suas obras podem valer mais depois de sua morte. Ele pode estar criando para gerações futuras.

A NATUREZA DO PENSAMENTO ORDENADO

Tipos de lógica
Lógica é o estudo do pensamento correto e ordenado. Estabelece critérios, autocontadição ou exclusão. Exemplo dos alunos que dizem para o professor que choveu porque o chão está molhado. Será que não foi lavado? Qual é a lógica disto? Professor deve cultivar a capacidade de pensar clara e corretamente. Examinemos dois tipos de lógica.

Lógica dedutiva
Dedução é a forma de raciocínio que parte de uma afirmação geral para uma particular. O silogismo é um raciocínio lógico dedutivo. Exemplo: Todos os homens são mortais. João é um homem. Logo, João é mortal. Nem sempre funciona. Exemplo: Todos os comunistas são totalitários. Todos os fascistas são totalitários. Logo, todos os fascistas são comunistas.

Lógica indutiva
É o raciocínio que parte do particular para o geral. Professor deve tomar cuidado para não cair em generalizações durante suas explicações.

Lógica e psicologia
Psicologia examina o processo real e concreto de pensar, a lógica estuda o conteúdo do que é pensado. Se um professor recompensar um estudante por pensar logicamente, o estudante vai querer continuar pensando logicamente para receber a recompensa.

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

DIREITOS HUMANOS E PESSOAS COM DEFIÊNCIA

PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA


SECRETARIA DE DIREITOS HUMANOS


PORTARIA Nº 2.344, DE 3 DE NOVEMBRO DE 2010


DOU de 05/11/2010 (nº 212, Seção 1, pág. 4)

O MINISTRO DE ESTADO CHEFE DA SECRETARIA DE DIREITOS HUMANOS DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA, no uso de suas atribuições legais, faz publicar a Resolução nº 1, de 15 de outubro de 2010, do Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência CONADE, que altera dispositivos da Resolução nº 35, de 6 de julho de 2005, que dispõe sobre seu Regimento Interno
Art. 1º - Esta portaria dá publicidade às alterações promovidas pela Resolução nº 1, de 15 de outubro de 2010, do Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência - CONADE em seu Regimento Interno.
Art. 2º - Atualiza a nomenclatura do Regimento Interno do CONADE, aprovado pela Resolução nº 35, de 6 de julho de 2005, nas seguintes hipóteses:
I - Onde se lê "Pessoas Portadoras de Deficiência", leia-se "Pessoas com Deficiência";
II - Onde se lê "Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República", leia-se "Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República"
III - Onde se lê "Secretário de Direitos Humanos", leia-se "Ministro de Estado Chefe da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República";
IV - Onde se lê "Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência", leia-se "Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência";
V - Onde se lê "Política Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência", leia-se "Política Nacional para Inclusão da Pessoa com Deficiência";
Art. 3º - Os artigos 1º, 3º, 5º, 9º e 11, passam a vigorar com a seguinte redação:
"Art. 1º -
............................................................................

........

XI - atuar como instância de apoio, em todo território nacional, nos casos de requerimentos, denúncias e reclamações formuladas por qualquer pessoa ou entidade, quando ocorrer ameaça ou violação de direitos da pessoa com deficiência, assegurados na Constituição Federal, na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiências e demais legislações aplicáveis;
XII - participar do monitoramento e implementação da Convenção sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência, para que os direitos e garantias que esta estabelece sejam respeitados, protegidos e promovidos; e
............................................................................

................." (NR).

Art. 3º - Os representantes das organizações nacionais, de e para pessoa com deficiência na forma do inciso II, alínea a, do art. 2º, serão escolhidos dentre os que atuam nas seguintes áreas:
............................................................................

..............................
II - um na área da deficiência auditiva e/ou surdez;
............................................................................

..............................

IV - dois na área da deficiência mental e/ou intelectual;
............................................................................

.................... (NR).

Art. 5º - As organizações nacionais de e para pessoas com deficiência serão representadas por entidades eleitas em Assembléia Geral convocada para esta finalidade e indicarão os membros titulares e suplentes
§ 1º - As entidades eleitas e os representantes indicados terão mandato de dois anos, a contar da data de posse, podendo ser reconduzidos.
§ 2º - A eleição será convocada pelo CONADE, por meio de edital publicado no Diário Oficial da União, no mínimo 90 (noventa) dias antes do término do mandato.

§ 4º - O edital de convocação das entidades privadas sem fins lucrativos e de âmbito nacional exigirá para a habilitação de candidatos e eleitores, quetenham filiadas organizadas em pelo menos cinco estados da federação, distribuídas, no mínimo, por três regiões do País.
............................................................................

.............................

§ 6º - O processo eleitoral será conduzido por Comissão Eleitoral formada por um representante do CONADE eleito para esse fim, um representante do Ministério Público Federal e outro da Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência - SNPD, especialmente convidados paraesse fim.
............................................................................

................... (NR).
Art. 9º - Os Conselhos Estaduais e Municipais de Direitos da Pessoa com Deficiência serão representados por conselheiros eleitos nas respectivas Assembléias Gerais estaduais ou municipais, convocadas para esta finalidade.
Parágrafo único - O Edital de Convocação para a habilitação dos Conselhos Estaduais e Municipais será publicado em Diário Oficial pelo menos 90 (noventa) dias antes do início dos novos mandatos e definirá as regras da eleição, exigindo que os candidatos comprovem estar em pleno funcionamento, ter composição paritária e caráter deliberativo.
Art. 11 -
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.........

§ 1º - A eleição do Presidente e do Vice-Presidente dar-se-á mediante escolha, dentre seus membros, por voto de maioria simples, para cumprirem mandato de dois anos.
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§ 4º - Fica assegurada a representação do Governo e da Sociedade Civil na Presidência e na Vice-Presidência do CONADE e a alternância dessas representações em cada mandato, respeitada a paridade.
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§ 6º - Caso haja vacância do cargo de Presidente, o Vice- Presidente assumirá e convocará eleição para escolha do novo Presidente, a fim de complementar o respectivo mandato, observado o disposto no § 4º deste artigo.
§ 7º - No caso de vacância da Vice-Presidência, o Plenário elegerá um de seus membros para exercer o cargo, a fim de concluir o mandato, respeitada a representação alternada de Governo e Sociedade Civil.
............................................................................

................... (NR).

Art. 4º - Revogam-se os §§ 1º, 2º e 3º do art. 9º da Resolução nº 35/2005.

Art. 5º - As alterações no Regimento Interno do CONADE entram em vigor na data de publicação desta Portaria.



PAULO DE TARSO VANNUCCHI




segunda-feira, 27 de setembro de 2010

CURSO DE ORATÓRIA E MARKETING PESSOAL

Recomendamos a leitura do livro acima, de autoria do Professor Claúdio de Souza, lançado em Belo Horizonte, pela Editora Lider, em sua primeira edição.

É um livro didático, indicado para advogados, empresários, educadores e todos aqueles que necessitam desmistificar e desenvolver uma comunicação envolvente e eficaz.

Para contatos e compra do livro: Professor Cláudio de Souza,
email: dr.claudius@hotmail.com
telefone: 0xx319777-9343

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

OS SOFISTAS

Os Sofistas
Período Sistemático
A Sofística
Moral, Direito e Religião
Protágoras de Abdera
Górgias de Leôncio
Período Sistemático

O segundo período da história do pensamento grego é o chamado período sistemático. Com efeito, nesse período realiza-se a sua grande e lógica sistematização, culminando em Aristóteles, através de Sócrates e Platão , que fixam o conceito de ciência e de inteligível, e através também da precedente crise cética da sofística. O interesse dos filósofos gira, de preferência, não em torno da natureza, mas em torno do homem e do espírito; da metafísica passa-se à gnosiologia e à moral. Daí ser dado a esse segundo período do pensamento grego também o nome de antropológico, pela importância e o lugar central destinado ao homem e ao espírito no sistema do mundo, até então limitado à natureza exterior.
Esse período esplêndido do pensamento grego - depois do qual começa a decadência - teve duração bastante curta. Abraça, substancialmente, o século IV a.C., e compreende um número relativamente pequeno de grandes pensadores: os sofistas e Sócrates, daí derivando as chamadas escolhas socráticas menores, sendo principais a cínica e a cirenaica, precursoras, respectivamente, do estoicismo e do epicurismo do período seguinte; Platão e Aristóteles, deles procedendo a Academia e o Liceu , que sobreviverão também no período seguinte e além ainda, especialmente a Academia por motivos éticos e religiosos, e em seus desenvolvimentos neoplatônicos em especial - apesar de o aristotelismo ter superado logicamente o platonismo.
A Sofística
Após as grandes vitórias gregas, atenienses, contra o império persa, houve um triunfo político da democracia, como acontece todas as vezes que o povo sente, de repente, a sua força. E visto que o domínio pessoal, em tal regime, depende da capacidade de conquistar o povo pela persuasão, compreende-se a importância que, em situação semelhante, devia ter a oratória e, por conseguinte, os mestres de eloqüência. Os sofistas, sequiosos de conquistar fama e riqueza no mundo, tornaram-se mestres de eloqüência, de retórica, ensinando aos homens ávidos de poder político a maneira de consegui-lo. Diversamente dos filósofos gregos em geral, o ensinamento dos sofistas não era ideal, desinteressado, mas sobejamente retribuído. O conteúdo desse ensino abraçava todo o saber, a cultura, uma enciclopédia, não para si mesma, mas como meio para fins práticos e empíricos e, portanto, superficial.
A época de ouro da sofística foi - pode-se dizer - a segunda metade do século V a.C. O centro foi Atenas, a Atenas de Péricles, capital democrática de um grande império marítimo e cultural. Os sofistas maiores foram quatro. Os menores foram uma plêiade, continuando até depois de Sócrates, embora sem importância filosófica. Protágoras foi o maior de todos, chefe de escola e teórico da sofística.
Moral, Direito e Religião
Em coerência com o ceticismo teórico, destruidor da ciência, a sofística sustenta o relativismo prático, destruidor da moral. Como é verdadeiro o que tal ao sentido, assim é bem o que satisfaz ao sentimento, ao impulso, à paixão de cada um em cada momento. Ao sensualismo, ao empirismo gnosiológicos correspondem o hedonismo e o utilitarismo ético: o único bem é o prazer, a única regra de conduta é o interesse particular. Górgias declara plena indiferença para com todo moralismo: ensina ele a seus discípulos unicamente a arte de vencer os adversários; que a causa seja justa ou não, não lhe interessa. A moral, portanto, - como norma universal de conduta - é concebida pelos sofistas não como lei racional do agir humano, isto é, como a lei que potencia profundamente a natureza humana, mas como um empecilho que incomoda o homem.
Desta maneira, os sofistas estabelecem uma oposição especial entre natureza e lei, quer política, quer moral, considerando a lei como fruto arbitrário, interessado, mortificador, uma pura convenção, e entendendo por natureza, não a natureza humana racional, mas a natureza humana sensível, animal, instintiva. E tentam criticar a vaidade desta lei, na verdade tão mutável conforme os tempos e os lugares, bem como a sua utilidade comumente celebrada: não é verdade - dizem - que a submissão à lei torne os homens felizes, pois grandes malvados, mediante graves crimes, têm freqüentemente conseguido grande êxito no mundo e, aliás, a experiência ensina que para triunfar no mundo, não é mister justiça e retidão, mas prudência e habilidade.
Então a realização da humanidade perfeita, segundo o ideal dos sofistas, não está na ação ética e ascética, no domínio de si mesmo, na justiça para com os outros, mas no engrandecimento ilimitado da própria personalidade, no prazer e no domínio violento dos homens. Esse domínio violento é necessário para possuir e gozar os bens terrenos, visto estes bens serem limitados e ambicionados por outros homens. É esta, aliás, a única forma de vida social possível num mundo em que estão em jogo unicamente forças brutas, materiais. Seria, portanto, um prejuízo a igualdade moral entre os fortes e os fracos, pois a verdadeira justiça conforme à natureza material, exige que o forte, o poderoso, oprima o fraco em seu proveito.
Quanto ao direito e à religião, a posição da sofística é extremista também, naturalmente, como na gnosiologia e na moral. A sofística move uma justa crítica, contra o direito positivo, muitas vezes arbitrário, contingente, tirânico, em nome do direito natural. Mas este direito natural - bem como a moral natural - segundo os sofistas, não é o direito fundado sobre a natureza racional do homem, e sim sobre a sua natureza animal, instintiva, passional. Então, o direito natural é o direito do mais poderoso, pois em uma sociedade em que estão em jogo apenas forças brutas, a força e a violência podem ser o único elemento organizador, o único sistema jurídico admissível.
A respeito da religião e da divindade, os sofistas não só trilham a mesma senda dos filósofos racionalistas gregos do período precedente e posterior, mas - de harmonia com o ceticismo deles - chegam até o extremo, até o ateísmo, pelo menos praticamente. Os sofistas, pois, servem-se da injustiça e do muito mal que existe no mundo, para negar que o mundo seja governado por uma providência divina.
Protágoras de Abdera
Protágoras nasceu em Abdera - pátria de Demócrito , cuja escola conheceu - pelo ano 480. Viajou por toda a Grécia, ensinando na sua cidade natal, na Magna Grécia, e especialmente em Atenas, onde teve grande êxito, sobretudo entre os jovens, e foi honrado e procurado por Péricles e Eurípedes. Acusado de ateísmo, teve de fugir de Atenas, onde foi processado e condenado por impiedade, e a sua obra sobre os deuses foi queimada em praça pública. Refugiou-se então na Sicília, onde morreu com setenta anos (410 a.C.), dos quais, quarenta dedicados à sua profissão. Dos princípios de Heráclito e das variações da sensação, conforme as disposições subjetivas dos órgãos, inferiu Protágoras a relatividade do conhecimento. Esta doutrina enunciou-a com a célebre fórmula; o homem é a medida de todas as coisas. Esta máxima significava mais exatamente que de cada homem individualmente considerado dependem as coisas, não na sua realidade física, mas na sua forma conhecida. Subjetivismo, relativismo e sensualismo são as notas características do seu sistema de ceticismo parcial. Platão deu o nome de Protágoras a um dos seus diálogos, e a um outro o de Górgias.
Górgias de Leôncio
Górgias nasceu em Abdera, na Sicília, em 480-375 a.C - correlacionado com Empédocles - representa a maior expressão prática da sofística, mediante o ensinamento da retórica; teoricamente, porém, foi um filósofo ocasional, exagerador dos artifícios da dialética eleática. Em 427 foi embaixador de sua pátria em Atenas, para pedir auxílio contra os siracusanos. Ensinou na Sicília, em Atenas, em outras cidades da Grécia, até estabelecer-se em Larissa na Tessália, onde teria morrido com 109 anos de idade. Menos profundo, porém, mais eloqüente que Protágoras, partiu dos princípios da escola eleata e concluiu também pela absoluta impossibilidade do saber. É autor duma obra intitulada "Do não ser", na qual desenvolve as três teses: Nada existe; se alguma coisa existisse não a poderíamos conhecer; se a conhecêssemos não a poderíamos manifestar aos outros. A prova de cada uma destas proposições e um enredo de sofismas, sutis uns, outros pueris.
No Górgias de Platão, Górgias declara que a sua arte produz a persuasão que nos move a crer sem saber, e não a persuasão que nos instrui sobre as razões intrínsecas do objeto em questão. Em suma, é mais ou menos o que acontece com o jornalismo moderno. Para remediar este extremo individualismo, negador dos valores teoréticos e morais, Protágoras recorre à convenção estatal, social, que deveria estabelecer o que é verdadeiro e o que é bem!


fONTE: MURAL DA FILOSOFIA

terça-feira, 3 de agosto de 2010

SOTAQUE MINEIRO

''Minas não é palavra montanhosa.
É palavra abissal. Minas é dentro
E fundo”

Carlos Drummond de Andrade


Gente, simplificar é um pecado. Se a vida não fosse tão corrida, se não tivesse tanta conta para pagar, tantos processos — oh sina — para analisar, eu fundaria um partido cuja luta seria descobrir as falas de cada região do Brasil.

Cadê os lingüistas deste país? Sinto falta de um tratado geral das sotaques brasileiros. Não há nada que me fascine mais. Como é que as montanhas, matas ou mares influem tanto, e determinam a cadência e a sonoridade das palavras?

É um absurdo. Existem livros sobre tudo; não tem (ou não conheço) um sobre o falar ingênuo deste povo doce. Escritores, ô de casa, cadê vocês? Escrevam sobre isto, se já escreveram me mandem, que espero ansioso.

Um simples" mas" é uma coisa no Rio Grande do Sul. É tudo menos um "mas" nordestino, por exemplo. O sotaque das mineiras deveria ser ilegal, imoral ou engordar. Porque, se tudo que é bom tem um desses horríveis efeitos colaterais, como é que o falar, sensual e lindo (das mineiras) ficou de fora?

Porque, Deus, que sotaque! Mineira devia nascer com tarja preta avisando: ouvi-la faz mal à saúde. Se uma mineira, falando mansinho, me pedir para assinar um contrato doando tudo que tenho, sou capaz de perguntar: só isso? Assino achando que ela me faz um favor.

Eu sou suspeitíssimo. Confesso: esse sotaque me desarma. Certa vez quase propus casamento a uma menina que me ligou por engano, só pelo sotaque.

Mas, se o sotaque desarma, as expressões são um capítulo à parte. Não vou exagerar, dizendo que a gente não se entende... Mas que é algo delicioso descobrir, aos poucos, as expressões daqui, ah isso é...

Os mineiros têm um ódio mortal das palavras completas. Preferem, sabe-se lá por que, abandoná-las no meio do caminho (não dizem: pode parar, dizem: "pó parar". Não dizem: onde eu estou?, dizem: "ôndôtô?"). Parece que as palavras, para os mineiros, são como aqueles chatos que pedem carona. Quando você percebe a roubada, prefere deixá-los no caminho.

Os não-mineiros, ignorantes nas coisas de Minas, supõem, precipitada e levianamente, que os mineiros vivem — lingüisticamente falando — apenas de uais, trens e sôs. Digo-lhes que não.

Mineiro não fala que o sujeito é competente em tal ou qual atividade. Fala que ele é bom de serviço. Pouco importa que seja um juiz, um jogador de futebol ou um ator de filme pornô. Se der no couro — metaforicamente falando, claro — ele é bom de serviço. Faz sentido...

Mineiras não usam o famosíssimo tudo bem. Sempre que duas mineiras se encontram, uma delas há de perguntar pra outra: "cê tá boa?" Para mim, isso é pleonasmo. Perguntar para uma mineira se ela tá boa, é como perguntar a um peixe se ele sabe nadar. Desnecessário.

Há outras. Vamos supor que você esteja tendo um caso com uma mulher casada. Um amigo seu, se for mineiro, vai chegar e dizer: — Mexe com isso não, sô (leia-se: sai dessa, é fria, etc).

O verbo "mexer", para os mineiros, tem os mais amplos significados. Quer dizer, por exemplo, trabalhar. Se lhe perguntarem com o que você mexe, não fique ofendido. Querem saber o seu ofício.

Os mineiros também não gostam do verbo conseguir. Aqui ninguém consegue nada. Você não dá conta. Sôcê (se você) acha que não vai chegar a tempo, você liga e diz:

— Aqui, não vou dar conta de chegar na hora, não, sô.

Esse "aqui" é outro que só tem aqui. É antecedente obrigatório, sob pena de punição pública, de qualquer frase. É mais usada, no entanto, quando você quer falar e não estão lhe dando muita atenção: é uma forma de dizer, olá, me escutem, por favor. É a última instância antes de jogar um pão de queijo na cabeça do interlocutor.

Mineiras não dizem "apaixonado por". Dizem, sabe-se lá por que, "apaixonado com". Soa engraçado aos ouvidos forasteiros. Ouve-se a toda hora: "Ah, eu apaixonei com ele...". Ou: "sou doida com ele" (ele, no caso, pode ser você, um carro, um cachorro). Elas vivem apaixonadas com alguma coisa.

Que os mineiros não acabam as palavras, todo mundo sabe. É um tal de bonitim, fechadim, e por aí vai. Já me acostumei a ouvir: "E aí, vão?". Traduzo: "E aí, vamos?". Não caia na besteira de esperar um "vamos" completo de uma mineira. Não ouvirá nunca.

Na verdade, o mineiro é o baiano lingüístico. A preguiça chegou aqui e armou rede. O mineiro não pronuncia uma palavra completa nem com uma arma apontada para a cabeça.

Eu preciso avisar à língua portuguesa que gosto muito dela, mas prefiro, com todo respeito, a mineira. Nada pessoal. Aqui certas regras não entram. São barradas pelas montanhas. Por exemplo: em Minas, se você quiser falar que precisa ir a um lugar, vai dizer:

— Eu preciso de ir.

Onde os mineiros arrumaram esse "de", aí no meio, é uma boa pergunta. Só não me perguntem. Mas que ele existe, existe. Asseguro que sim, com escritura lavrada em cartório. Deixa eu repetir, porque é importante. Aqui em Minas ninguém precisa ir a lugar nenhum. Entendam... Você não precisa ir, você "precisa de ir". Você não precisa viajar, você "precisa de viajar". Se você chamar sua filha para acompanhá-la ao supermercado, ela reclamará:

— Ah, mãe, eu preciso de ir?

No supermercado, o mineiro não faz muitas compras, ele compra um tanto de coisa. O supermercado não estará lotado, ele terá um tanto de gente. Se a fila do caixa não anda, é porque está agarrando lá na frente. Entendeu? Deus, tenho que explicar tudo. Não vou ficar procurando sinônimo, que diabo. E não digo mais nada, leitor, você está agarrando meu texto. Agarrar é agarrar, ora!

Se, saindo do supermercado, a mineirinha vir um mendigo e ficar com pena, suspirará:

— Ai, gente, que dó.

É provável que a essa altura o leitor já esteja apaixonado pelas mineiras. Eu aviso que vá se apaixonar na China, que lá está sobrando gente. E não vem caçar confusão pro meu lado.

Porque, devo dizer, mineiro não arruma briga, mineiro "caça confusão". Se você quiser dizer que tal sujeito é arruaceiro, é melhor falar, para se fazer entendido, que ele "vive caçando confusão".

Para uma mineira falar do meu desempenho sexual, ou dizer que algo é muitíssimo bom (acho que dá na mesma), ela, se for jovem, vai gritar: "Ô, é sem noção". Entendeu, leitora? É sem noção! Você não tem, leitora, idéia do tanto de bom que é. Só não esqueça, por favor, o "Ô" no começo, porque sem ele não dá para dar noção do tanto que algo é sem noção, entendeu?

Ouço a leitora chiar:

— Capaz...

Vocês já ouviram esse "capaz"? É lindo. Quer dizer o quê? Sei lá, quer dizer "tá fácil que eu faça isso", com algumas toneladas de ironia. Gente, ando um péssimo tradutor. Se você propõe a sua namorada um sexo a três (com as amigas dela), provavelmente ouvirá um "capaz..." como resposta. Se, em vingança contra a recusa, você ameaçar casar com a Gisele Bundchen, ela dirá: "ô dó dôcê". Entendeu agora?

Não? Deixa para lá. É parecido com o "nem...". Já ouviu o "nem..."? Completo ele fica:

- Ah, nem...

O que significa? Significa, amigo leitor, que a mineira que o pronunciou não fará o que você propôs de jeito nenhum. Mas de jeito nenhum. Você diz: "Meu amor, cê anima de comer um tropeiro no Mineirão?". Resposta: "nem..." Ainda não entendeu? Uai, nem é nem. Leitor, você é meio burrinho ou é impressão?

A propósito, um mineiro não pergunta: "você não vai?". A pergunta, mineiramente falando, seria: "cê não anima de ir"? Tão simples. O resto do Brasil complica tudo. É, ué, cês dão umas volta pra falar os trem...

Certa vez pedi um exemplo e a interlocutora pensou alto:

— Você quer que eu "dou" um exemplo...

Eu sei, eu sei, a gramática não tolera esses abusos mineiros de conjugação. Mas que são uma gracinha, ah isso lá são.

Ei, leitor, pára de babar. Que coisa feia. Olha o papel todo molhado. Chega, não conto mais nada. Está bem, está bem, mas se comporte.

Falando em "ei...". As mineiras falam assim, usando, curiosamente, o "ei" no lugar do "oi". Você liga, e elas atendem lindamente: "eiiii!!!", com muitos pontos de exclamação, a depender da saudade...

Tem tantos outros... O plural, então, é um problema. Um lindo problema, mas um problema. Sou, não nego, suspeito. Minha inclinação é para perdoar, com louvor, os deslizes vocabulares das mineiras.

Aliás, deslizes nada. Só porque aqui a língua é outra, não quer dizer que a oficial esteja com a razão. Se você, em conversa, falar:

— Ah, fui lá comprar umas coisas...

— Que' s coisa? — ela retrucará.

Acreditam? O plural dá um pulo. Sai das coisas e vai para o que.

Ouvi de uma menina culta um "pelas metade", no lugar de "pela metade". E se você acusar injustamente uma mineira, ela, chorosa, confidenciará:

— Ele pôs a culpa "ni mim".

A conjugação dos verbos tem lá seus mistérios, em Minas... Ontem, uma senhora docemente me consolou: "preocupa não, bobo!". E meus ouvidos, já acostumados às ingênuas conjugações mineiras. nem se espantam. Talvez se espantassem se ouvissem um: "não se preocupe", ou algo assim. A fórmula mineira é sintética. e diz tudo.

Até o tchau. em Minas. é personalizado. Ninguém diz tchau pura e simplesmente. Aqui se diz: "tchau pro cê", "tchau pro cês". É útil deixar claro o destinatário do tchau. O tchau, minha filha, é prôcê, não é pra outra entendeu?

Deve haver, por certo, outras expressões... A minha memória (que não ajuda muito) trouxe essas por enquanto. Estou, claro, aberto a sugestões. Como é uma pesquisa empírica, umas voluntárias ajudariam... Exigência: ser mineira. Conversando com lingüistas, fui informado: é prudente que tenham cabelos pretos, espessos e lisos, aquela pele bem branquinha... Tudo, naturalmente, em nome da ciência. Bem, eu me explico: é que, características à parte, as conformações físicas influem no timbre e som da voz, e eu não posso, em honrados assuntos mineiros, correr o risco de ser inexato, entendem?

E-Mails: felipepeixoto@oi.com.br



Felipe Peixoto Braga Netto (1973) afirma que não é jornalista, não é publicitário, nunca publicou crônicas ou contos, não é, enfim, literariamente falando, muita coisa, segundo suas palavras. Mora em Belo Horizonte e ama Minas Gerais. Ele diz que nunca publicou nada, mas a crônica que apresentamos foi extraída do livro "As coisas simpáticas da vida", Landy Editora, São Paulo (SP) - 2005, pág. 82.
Sotaque mineiro: é ilegal, imoral ou engorda?
Felipe Peixoto Braga Netto

domingo, 1 de agosto de 2010

A FILOSOFIA DO DIREITO E A INTERNET

Amadeu dos Anjos Vidonho Junior

Advogado, Especialista em Direito Civil e Processo Civil pela – UNESA
Pós Graduando em Direito Tributário e Legislação de Impostos - UNESA
Mestre em Filosofia do Direito pela UFPa
Professor de Direito da Universidade Federal do Pará – UFPa
Professor convidado da Escola Superior de Advocacia ESA/OAB/PA
Autor


Sumário: 1.0 A Filosofia do Direito e a Internet. 1.1 O Novo Desafio da Filosofia do Direito e a Internet. O Jurisfilósofo do Século XXI. Conclusão.
1.0_A FILOSOFIA DO DIREITO E A INTERNET


“Navegar é Preciso,
Viver não é preciso.”
In “Navegar é Preciso” – Fernando Pessoa

1.1 _Introdução

A evolução acertou o ser humano a ponto de torna-lo completamente dependente, mas adaptável ao seu meio. A revolução de conhecimentos e informações chega tal como uma onda e seu movimento cíclico imposto pelos ventos. Mas em épocas atrás ao modo dessas, já se almejava os resultados da evolução a que hodiernamente chegamos.

O responsável por isso é sem dúvida o homem, para quem todo o conhecimento serve e deve convergir, pois não se pode admitir tutelas que não as de escopo humanista, pois toda a vida só ao homem interessa. Assim também o conhecimento, por conta disto a espécie perseverou, e venceu os estágios históricos até a modernidade.

Todo o conhecimento deve ter um fim, e uma finalidade em favor da preservação do homem e seu meio, pois nada mais interessa senão a permanência do homem no planeta terra. Mas o que os homens fizeram ou estão fazendo para que isso se torne uma realidade? Será mesmo o que se está fazendo, promove a adaptação social do homem ao seu meio ambiente?

Ao acordar, o homem passeia por milhares de informações distribuídas em seu dia, até chegar ao sono que o ajuda a renová-las. A partir daí, o homem deste século não é mais o homem que sobreviveu no século passado, e assim por diante, necessita sobremaneira não mais da visão individualista como, aliás, concebiam os Sofistas , a qual se reduzia a seu ambiente próximo; mas da visão de mundo. Hoje, para se estudar um fenômeno jurídico não nos ocupamos com apenas o fato em si, mas também, com os outros fatos conexos, para que através de várias visões de vínculo, absorvamos o real significado do todo a que estamos envolvidos e assim podermos especular sobre as realidades a que nos propomos.

Então, simplesmente aportamos na “auto-reflexão do espírito sobre seu comportamento valorativo teórico e prático e, igualmente, aspiração a uma inteligência das conexões últimas das coisas, a uma visão racional de mundo” , por certo, ancoramos na filosofia. Para Johannes Hessen “a filosofia é a tentativa do espírito humano de atingir uma visão de mundo, mediante a auto-reflexão sobre suas funções valorativas teóricas e práticas” . Daí a imprescindível diferença entre as Ciências particulares e sua especialização, e a Filosofia com sua universalidade.

“Enquanto as ciências particulares tomam por objeto uma parte da realidade, a filosofia dirige-se à totalidade do real”. , muito embora não seja errado concebermos a Filosofia como muitos a denominam, de ciência universal.

Não obstante a isso, esta universalidade, podemos constatar pode ser encontrada hodiernamente com um simples clique do mouse, na Internet. Muito diferente das épocas antigas onde os filósofos, “amantes do saber”, viajavam incessantemente para divulgar oralmente suas idéias nas praças e logradouros públicos. Destes fatos, poucos restaram como prova de ensinamentos filosóficos, pois a oralidade impôs como método de estudo apenas as críticas e relatos registrados por outros filósofos, como é o caso das idéias dos Sofistas (século v A.C.) e de seu crítico, Sócrates (469 a 399 A. C.) .

Contudo, hoje com a Internet não se mostram mais os riscos de outrora: pesquisam-se, copiam-se, colam-se, citam-se, gravam-se e armazenam-se dados e idéias expostas no ciberespaço, informações imprescindíveis à criação. Este processo, que revolucionou a “Teoria do Conhecimento” enquanto doutrina da Ciência e, por conseguinte, da Filosofia, não pode permanecer aquém da segurança jurídica que toda sociedade deve inspirar. Deve eminentemente estar sob a regulamentação do direito, pois está a se firmar como um bem jurídico relevante ao homem, enquanto na busca de suas criações.

Dessa regulamentação jurídica é que vem a preocupação da relação entre a Internet, a Filosofia e a Filosofia do Direito, que nada mais é do que uma “projeção do saber filosófico no âmbito do direito” . Versa ainda o mesmo autor que a Filosofia do Direito “consiste na pesquisa conceptual do Direito e implicações lógicas, por seus princípios e razões mais elevados, e na reflexão crítico-valorativa das instituições jurídicas.”

Em todas essas realidades, Direito, Filosofia e Internet, impera o meio essencial para a criação e a experimentação: o pensamento.

1.2 _O Novo Desafio da Filosofia do Direito e a Internet.

DEL VECCHIO, professor da Universidade de Roma nos ensina que “A História da Filosofia é, por conseguinte, meio de estudo e de investigação, e, como tal, poderosa ajuda para o nosso trabalho: oferece-nos repositório de observações, de raciocínios, de distinções, que a um homem só, no decurso da vida, seria impossível ocorrer.”

Sem dúvida podemos afirmar modernamente que a Internet tal como a História da Filosofia “oferece-nos repositório de observações, de raciocínios, de distinções, que a um homem só, no decurso da vida, seria impossível ocorrer.”, e ainda mais, oferece-nos acesso à universalidade, onde podemos pesquisar e encontrar os pensamentos de todo o planeta. Perfect! É como exclamaríamos em dialeto Inglês.

A começar por este texto, que se inspirou no poema “Navegar é Preciso” extraído após breve busca através do navegador, e em alguns segundos pela home page, onde houve acesso a uma série de informações a respeito do autor e ainda suas obras completas, mesmo considerando ser hoje um domingo e a maioria das bibliotecas, fechadas.

Ora então a Internet é um eficiente meio de executar o pensamento e pesquisar idéias além da obtenção de uma universalidade de dados a que a só um homem não seria possível ocorrer, no decurso da vida.

A Internet é um dos meios modernos para se filosofar, e enquanto assim, possuidora de conhecimentos universais e dentre estes, também jurídicos, podendo ser concebida como ponto especulativo da epistemologia do conceito do Direito e assuntos afins e da axiologia das instituições jurídicas, que na concepção de Paulo Nader são verdadeiros objetos da Filosofia do Direito.

Por conclusão, o grande desafio da Filosofia do Direito e da Internet é a aproximação do filósofo, do jurista e do jurisfilósofo, para que por meio da Internet promovam através da crítica e da reflexão o aprimoramento das instituições jurídicas e logo sua evolução. Deve sem dúvida haver no ciberespaço maior troca de experiências a ponto de impedirmos a involução de idéias e ideais, pois operantes apenas vinculadas à época de sua concepção e nunca para todo o sempre.

“John Locke (1632-1704), filósofo inglês que publicou Ensaio sobre o entendimento Humano busca na experiência a fonte do conhecimento” , porquanto, uma experiência se de interesse para humanidade não serve apenas a um homem, mas a toda uma comunidade e porque não também aos internautas de todo o mundo?

1.3 _O Jurisfilósofo do Século XXI

Sobre a terminologia “jurisfilósofo” muito bem explica Paulo Nader que “De um modo geral, os jurisfilósofos foram, originariamente, juristas com formação filosófica.”

Porquanto, a vida e a cultura mudaram desde os primeiros filósofos que tiveram na Grécia, berço de concreta autonomia. No Brasil, particularmente, a filosofia teve seu período fosco passando várias décadas sem ocupar lugar relevante na sociedade, e talvez seja graças a esse lapso temporal que a ciência andou desgovernada até chegar no momento atual de rever todos seus pressupostos com vista à evolução.

A reflexão júris-filosófica conta hoje com um meio eficiente para a sua propagação, a Internet. E todos os jurisfilósofos que almejam chegar ao conhecimento universal sobre determinada realidade, devem dela extrair o conhecimento. Deve a Internet ser meio para o conhecimento e a reflexão sobretudo dos textos que os demais júrisfilósofos expõem à sociedade através dos web sites.

O Jurisfilósofo do século XXI está hodiernamente mais perto do que nunca do conhecimento universal, tão perto a ponto de sua separação significar um clique do mouse. Infelizmente, isso não ocorria com os grandes filósofos passados, que apenas tinham como objeto de reflexão os discursos orais em determinada praça.



1.4_CONCLUSÃO

O eminente poeta lisboeta Fernando Antônio Nogueira Pessoa (1888-1935), na sua época, já proclamava tendo em vista celebre frase usada por Pompeu (106-48 a.C.), dita aos marinheiros, amedrontados, que recusavam viajar durante a guerra, cf. Plutarco, in Vida de Pompeu : “Navigare necesse; vivere non est necesse” . Portanto, “Navegar é preciso, viver não é preciso”, mas a força da frase não é tão firme enquanto solta do restante dos versos que agora passamos a complementar:

“Navegadores antigos tinham uma frase gloriosa:

"Navegar é preciso; viver não é preciso".

Quero para mim o espírito [d]esta frase,
transformada a forma para a casar como eu sou:
Viver não é necessário; o que é necessário é criar.
Não conto gozar a minha vida; nem em gozá-la penso.
Só quero torná-la grande,
ainda que para isso tenha de ser o meu corpo e a (minha alma) a lenha desse fogo.
Só quero torná-la de toda a humanidade;
ainda que para isso tenha de a perder como minha.
Cada vez mais assim penso.
Cada vez mais ponho da essência anímica do meu sangue
o propósito impessoal de engrandecer a pátria e contribuir
para a evolução da humanidade.
É a forma que em mim tomou o misticismo da nossa Raça.”

Tão forte e perseverante são os verbos quanto adaptáveis à modernidade.

Hodiernamente, “navegar” é preciso! Mas também, podemos dizer em metáfora, pelos programas ou navegadores que permitem o acesso das informações disponibilizadas pela Internet. Transpondo-se ao ciberespaço, temos que para o internauta, navegar é preciso.

“Viver não é preciso”, pois a única forma de modificarmos o meio e a ele adaptarmo-nos é a criação, como mesmo esta foi o começo de tudo, porquanto o que é preciso é criar diz o poeta, com a nossa concordância, sendo que a Internet é poderosa ferramenta para tal.

Finalizando, é necessário citarmos também DEL VECCHIO, segundo o qual, “Os problemas filosóficos que hoje discutimos são fundamentalmente os mesmos que aos filósofos antigos se mostraram, ainda que de modo germinal ou embrionário.” , isto está a ocorrer de vez que, há muito salta dos pesquisadores apenas o amor ao direito, dissociado do “amor ao saber” que a filosofia nos propõe. E sem uma análise com vista à universalidade do Direito conjugado com a crítica filosófica e assim, pela Filosofia do Direito, não haverá evolução das idéias e aí o homem perderá espaço frente às novas problemáticas.

Contudo, hoje, bem longe do ontem, dispomos de um meio onde todos podem dissertar sobre o saber jurídico, dispomos do mais eficaz meio de comunicação e troca de conhecimentos, dispomos do melhor meio de filosofar como necessidade e intuito de criação, dispomos da Internet, pois, “não se consegue chegar ao Direito legítimo sem a reflexão filosófica.”

Fonte: Inclusão Jurídica

segunda-feira, 26 de julho de 2010

OS PAIS ENVELHECEM

Talvez a mais rica, forte e profunda experiência da caminhada humana seja a de ter um filho.

Plena de emoções, por vezes angustiante, ser pai ou mãe é provar os limites que constituem o sal e o mel do ato de amar alguém.

Quando nascem, os filhos comovem por sua fragilidade, seus imensos olhos, sua inocência e graça.

Basta vê-los para que o coração se alargue em riso e cor. Um sorriso é capaz de abrir as portas de um paraíso.

Eles chegam à nossa vida com promessas de amor incondicional. Dependem de nosso amor, dos cuidados que temos. E retribuem com gestos que enternecem.

Mas os anos passam e os filhos crescem. Escolhem seus próprios caminhos, parceiros e profissões. Trilham novos rumos, afastam-se da matriz.

O tempo se encarrega da formação de novas famílias. Os netos nascem. Envelhecemos. E então algo começa a mudar.

Os filhos já não têm pelos pais aquela atitude de antes. Parece que agora só os ouvem para fazer críticas, reclamar, apontar falhas.

Já não brilha mais nos olhos deles aquela admiração da infância e isso é uma dor imensa para os pais.

Por mais que disfarcem, todo pai e mãe percebe as mínimas faíscas no olho de um filho.

É quando pais, idosos, dizem para si mesmos: Que fiz eu? Por que o encanto acabou? Por que meu filho já não me tem como seu herói particular?

Apenas passaram-se alguns anos e parece que foram esquecidos os cuidados e a sabedoria que antes era referência para tudo na vida.

Aos poucos, a atitude dos filhos se torna cada vez mas impertinente. Praticamente não ouvem mais os conselhos.

A cada dia demonstram mais impaciência. Acham que os pais têm opiniões superadas, antigas.

Pior é quando implicam com as manias, os hábitos antigos, as velhas músicas. E tentam fazer os velhos pais se adaptarem aos novos tempos, aos novos costumes.

Quanto mais envelhecem os pais, mais os filhos assumem o controle. Quando eles estão bem idosos, já não decidem o que querem fazer ou o que desejam comer e beber. Raramente são ouvidos quando tentam fazer algo diferente.

Passeios, comida, roupas, médicos – tudo passa a ser decidido pelos filhos.

E, no entanto, os pais estão apenas idosos. Mas continuam em plena posse da mente. Por que então desrespeitá-los?

Por que tratá-los como se fossem inúteis ou crianças sem discernimento?

Sim, é o que a maioria dos filhos faz. Dá ordens aos pais, trata-os como se não tivessem opinião ou capacidade de decisão.

E, no entanto, no fundo daqueles olhos cercados de rugas, há tanto amor. Naquelas mãos trêmulas, há sempre um gesto que abençoa, acaricia.

* * *

A cada dia que nasce, lembre-se, está mais perto o dia da separação. Um dia, o velho pai já não estará aqui.

O cheiro familiar da mãe estará ausente. As roupas favoritas para sempre dobradas sobre a cama, os chinelos em um canto qualquer da casa.

Então, valorize o tempo de agora com os pais idosos. Paciência com eles quando se recusam a tomar os remédios, quando falam interminavelmente sobre doenças, quando se queixam de tudo.

Abrace-os apenas, enxugue as lágrimas deles, ouça as histórias (mesmo que sejam repetidas)e dê-lhes atenção, afeto...

Acredite: dentro daquele velho coração brotarão todas as flores da esperança e da alegria.

segunda-feira, 12 de julho de 2010

A HISTÓRIA DE CADA UM

A HISTÓRIA DE CADA UM


Por: Silvania Margarida


UMA HISTÓRIA DE CADA UM


 A Educação Especial no Brasil tem sido concebida, tradicionalmente, como destinada apenas ao atendimento de alunos com deficiências; condutas típicas de síndromes e quadros psicológicos, neurológicos ou psiquiátricos, bem como de alunos que apresentam altas habilidades/ superdotação.    Com a adoção do conceito de necessidades educacionais especiais, atualmente, é afirmado o compromisso com uma nova abordagem que vislumbra a inclusão social. Pelo menos, teoricamente.


Nossa identidade social é uma construção histórica e humana que se desenvolve no terreno da cultura e da educação. Pouco se reflete sobre a pluralidade da experiência humana de nosso povo, experiência que se enriquece na cultura e anseia pela liberdade. A educação deve atuar, pois, no processo de construção da cidadania, numa crescente igualdade de direitos. Neste aspecto, a pluralidade é uma fonte de crescimento educacional. O reconhecimento da pluralidade é, também, fundamental na mudança das formas de pensar das pessoas, para ampliar sua leitura de mundo, superar os preconceitos e combater atitudes discriminatórias. A escola é o espaço onde se concretizam as aprendizagens do reconhecimento da pluralidade, da convivência com a diversidade e respeito às diferenças. Há uma grande convergência de pontos de vista,  quanto à necessidade de abrir novos caminhos em educação especial brasileira. A lembrança é de que cada um ser eficiente especial[i] tem sua história de vida para contar.


 As diferenças, as desigualdades, as injustiças, a pluralidade cultural, racial, étnica, religiosa, nos sensibilizam e nos desafiam a realizar uma outra educação. E a tratar diferentemente as questões a ela ligadas, tais como a formação docente e as formas de gestão e de investigação. Tudo para levar em conta o desejo de criar coisas novas, coisas outras, com vistas a construir uma outra sociedade, na qual as mazelas da atual sejam superadas e as ricas virtualidades sejam criativamente incorporadas..


 Certamente tem havido muitos discursos, muitas elaborações teórico-conceituais sobre tais questões, expressando o desejo de mudança. Mas é certo, igualmente, que em múltiplos recantos da sociedade civil e mesmo dentro de diferentes instâncias do Poder Público (federal, estadual e, sobretudo, municipal) se realizam tentativas de criar essa "outra" educação, essa "outra" formação, essa "outra" gestão, essa "outra" investigação. Até porque na perspectiva de tal contexto, e como reação à discriminação e à exclusão social, tem-se desenvolvido no país, uma cultura de resistência, alimentada pelos interesses e necessidades da vida dos oprimidos, expressando o esforço dos excluídos (trabalhadores sem terra, negros, populações indígenas, outros movimentos sociais) por assegurar seus espaços.


A cultura da libertação dos setores dominados tem feito romper com o paradigma da resistência e do ajustamento forçado, e avançar na criação de uma nova consciência de libertação, na convicção de serem novos sujeitos da história, na  construção de um projeto alternativo de uma nova sociedade. Aos educadores brasileiros, de maneira particular, cumpre entender essa realidade social, porquanto só o entendimento será capaz de alimentar projetos de reconstrução. Os educadores precisam conhecer de perto, e a fundo, a realidade social e entrar em comunhão, porquanto o ato de conhecer representa o caminho para a compreensão de uma realidade cotidiana, gerando efeitos e desdobramentos dificíeis que exige olhar meticuloso e delicado,  e  que permite  realizar a conversão do conhecimento em ação. 


Essa conversão e reconversão têm caráter epistêmico: a práxis do educador é esse movimento dialético entre a conversão do conhecimento em ação transformadora, e a conversão da ação transformadora em conhecimento. E isso em boa medida vem acontecendo. É oportuno, então, abrir espaços no meio acadêmico para permitir que essas novas propostas venham a público de forma sistemática e, ao virem, possam ser conhecidas, valorizadas e analisadas. Se a busca de uma nova consciência e de novos caminhos só pode acontecer a partir de uma mudança profunda de cada membro da sociedade, que tem direito a uma convivência feliz e à cidadania, a nova sociedade somente pode ser construída como resultado da atuação histórica dos cidadãos. É preciso, portanto, recriar e multiplicar os espaços do cidadão, ampliando sua participação na vida social, tendo os processos educativos como estratégia iniludível.


Alguns dilemas atuais precisam ser superados no processo de uma educação transformadora.  Se, de um lado escola, família, grupos sociais, meios de comunicação,  são instâncias sociais que cumprem a função reprodutora da comunidade social, os desafios da mudança social geram um complexo e dialético processo de socialização que a escola se propõe cumprir: a ela é delegada a responsabilidade básica de preparar as gerações para sua incorporação na vida social e no mundo do trabalho. Sabemos que o significado de tal preparação traz discrepâncias enormes. Como promover a igualdade de oportunidades, como respeitar as diferenças sociais dos indivíduos? A construção da cidadania não pode consistir num conceito: tem que se concretizar na realidade vivencial dos sujeitos.


Estes, por sua vez, precisam ser educados na formação de novos valores e princípios, inspirados na construção social coletiva, na solidariedade e na participação. O verdadeiro sentido da real educação é a agregação de valores humanos frente à história de cada um.


 


 


[i] Criação de Silvânia Mendonça Almeida Margarida


Perfil do Autor


Silvania Mendonça é Mestre em Linguistica, Educação e Doutora em Educação.


Estudante de Direito e tem M.B.A. em Gestão Ambiental e História

(Artigonal SC #2804554)


Fonte do Artigo - http://www.artigonal.com/educacao-infantil-artigos/a-historia-de-cada-um-2804554.html

sexta-feira, 9 de julho de 2010

GRÓCIO

Grócio e outros escritores de seu tempo

A renovação operada também no campo da Filosofia teórica na época do Renascimento, e na que o sucedeu de imediato, é representada principalmente por Telésio, Bruno, Campanella; sobretudo pelos dois pensadores com os quais a Filosofia moderna se anuncia propriamente nos seus caracteres programáticos e sistemáticos, Francesco Bacon (1561/1626) e Renato Descartes (Cartesius; 1596/1650).
Os métodos de um e de outro são aparentemente opostos. Bacon quer restaurar a ciência, com a observação dos fenômenos naturais, substituindo o procedimento indutivo pelo dedutivo, pondo seus experimentos no lugar dos silogismos.
Antes dele, salvo tentativas de alguns precursores isolados, a Física era estudada em Aristóteles, cuja autoridade indiscutível punha-se em detrimento do desenvolvimento da pesquisa científica.
O método experimental, empírico e positivo, que tantos seguidores teria nas idades posteriores, é, pois, instaurado por Bacon. Sua obra, da qual se pode aproximar a de seu contemporâneo Galileu Galilei (1564/1642), desenvolve-se com propósitos análogos e fecundos de descobertas maravilhosas.
Descartes, porém, toma como ponto de partida a consciência individual. Quer libertar-se de todas as opiniões recebidas, emancipando-se, em um primeiro momento, da autoridade dos dogmas, e submetendo, metodicamente, todo dado, todo conhecimento, à dúvida. Estabelece, assim, como primeira certeza a só existência do seu pensamento que duvida (cogito, ergo sum: penso; logo, existo, isto é: existo porque penso - sum cogitans - penso porque duvido).
Destarte, põe em primeira plana o problema gnoseológico e o dirige para a solução, buscando na própria consciência o princípio de toda certeza.
Nessa afirmação metodológica, inspiraram-se as sucessivas escolas do racionalismo, do idealismo e do criticismo. Porém, bem considerado, também o posicionamento baconiano e galileico implica a afirmação dos poderes cognoscitivos da razão humana, pois pressupõe que a razão humana esteja em condições de, por si, descobrir a verdade, perquirindo os fenômenos.
Importância mais direta para a Filosofia do Direito tem Hugo Grócio (Groot), holandês (1583/1645), autor da obra Do direito da guerra e da paz (De jure belli ac pacis), em três livros, publicada em 1625.
Grócio é notável sobretudo porque, diferentemente dos outros autores mencionados, os quais trataram de questões políticas particulares, remonta aos princípios gerais da matéria, da qual tenta uma sistematização completa, sendo comumente considerado o fundador da moderna Filosofia do direito.
Deve-se notar ainda que ele teve, também nesse propósito, alguns precursores como, por exemplo,os três protestantes alemães João Oldendorp, Nicolau Hemming e Benedito Winkler, que publicaram suas obras sobre direito natural entre 1539 e 1615 (é especialmente notável o tratado de Winkler, Principiorum juris libri quinque, editado em 1615; (cf. sobre esses autores o livro de Kaltenborn, Os precursores de Ugo Grozio, em alemão, 1848).
Singular importância tem também nesse período, imediatamente antes de Grócio, a obra do espanhol Francesco Suarez (1548/1617), De legibus ac Deo legislatore (1612), da qual faremos ainda um resumo adiante.
Esta obra, rica de idéias profundas, tem, porém, ainda, certo caráter dogmático e contém numerosas referências à Teologia, enquanto Grócio, ao contrário, quer ater-se tão só à razão e apresentar, sobre esta base, princípios válidos para todos os homens, independentemente da religião.
Já o título de seu tratado (De jure ac pacis) demonstra que Grócio tinha precipuamente em vista o direito internacional, isto é, queria determinar as relações jurídicas que devem existir entre os Estados, seja na guerra, seja na paz.
Ensaios desse gênero tinham já existido, especialmente de autores italianos e espanhóis. Recordaremos os escritos de Giovanni da Legnano, professor em Bolonha - morto em 1383: De bello (Da guerra, 1360); do espanhol Francisco Arias de Valderas - aluno do Colégio de S. Clemente em Bolonha: Libelius de belli justitia injustitiave (Sobre a justiça ou injustiça da guerra, 1533); de Francisco de Vitoria, outro importante autor espanhol, ao qual retornaremos (De Indis, De jure belli, 1483/1546, etc., cerca de 1537/1539; 1. ed., póstuma, 1557); de Pietro Belli da Alba in Piemonte (1502/1575): De re militari et bello (1563); de Baltazar Ayala, nascido em Anversa, de pai espanhol, em 1548, e morto em 1584: De jure et officiis bellicis et disciplina militari (1582); e, sobretudo, de Alberico Gentili, nascido em San Genesio (na Província de Ancona) em 1552, e morto em Londres em 1608, depois de ter ensinado por mais de vinte anos na Universidade de Oxford.
No seu tratado De jure belli (1588) e em outras obras suas, Gentili revela-se um dos maiores teóricos do direito internacional, preocupado em dar à prática da guerra, além das relações pacíficas entre os Estados, um verdadeiro e próprio regulamento jurídico.
A obra de Gentili foi muito negligenciada. Grócio apenas acena para ela, mas dela serviu-se largamente. Em nossos dias o jurista inglês T.E. Holland republicou o De jure belli e escreveu uma monografia sobre Gentili. Na Itália, Aurélio Saffi, em 1878, fez e publicou sobre Gentili uma série de leituras. Escreveram ainda sobre Gentili: De Giorgi, Speranza, Fiorini (que lhe traduziu em italiano a obra principal, O direito de guerra, 1877), etc.
Gentili não é, certamente, inferior a Grócio como jurista; mas, no confronto entre ele e outros escritores semelhantes, Grócio tem o mérito de ter querido e sabido ir das questões particulares de direito internacional aos princípios filosóficos gerais. Ele não foi apenas jurista, mas também filósofo e, embora sem grande originalidade, soube realizar uma obra sistemática.
Ao dar esse caráter à sua obra, Grócio foi induzido também por considerações práticas, porque advertiu que um sistema de direito internacional devia fundar-se sobre bases diversas daquelas próprias dos sistemas jurídicos positivos de cada Estado.
Na era precedente, e em toda a Idade Média, sobre cada Estado tinham exercido (como vimos) uma espécie de hegemonia duas grandes autoridades, a Igreja e o Império, as quais, de qualquer forma, tinham regulado as relações internacionais. Ao tempo de Grócio, essas duas autoridades tinham perdido, finalmente, sua importância política: o sonho de um Império ou de uma Igreja, universais como poder político, esvanecera.
Era, então, preciso encontrar outras bases para determinar as relações jurídicas entre os Estados autônomos, limitados em seu território, mas absolutamente soberanos entre suas próprias fronteiras, e iguais, juridicamente, entre eles.
Grócio estabeleceu esses princípios, retornando às fontes clássicas, em especial a Aristóteles. Colhe deste a teoria fundamental, que o homem é sociável por sua natureza e destinado a uma certa forma de sociedade (política): Inter haec enim autem, quae homini sunt propria, est appetitus societatis, id est communitatis, non qualiscumque, sed tranquillae et pro sui intellectus modo ordinatae (De jure belli ac pacis, Proleg., § 6° = "Entre as coisas, pois, que são adequadas ao homem, está o desejo de sociedade, isto é, de comunidade, não de qualquer sociedade, mas de sociedade pacífica e ordenada exclusivamente em benefício de sua inteligência").
O direito é o que se mostra segundo a razão (não pela revelação) apto a tornar possível a convivência social, isto é, o que a reta razão demonstra conforme a natureza sociável do homem. Jus naturale est dictatum rectae rationis, indicans actui alicui, ex eius convenientia aut disconvenientia cum ipsa natura rationali ac sociali, inesse moralem turpitudinem, aut necessitatem moralem (Lib. I, cap. I, § 10; cf. § 12 = "Direito natural é uma imposição da reta razão que indica, para determinado ato, que é ele uma torpeza moral ou uma necessidade moral, segundo sua conveniência ou não conveniência com a própria razão natural ou social").
Grócio alcança substancial independência do direito em relação à Teologia e põe explicitamente em relevo tal independência. O direito natural, afirma, o sustentaria ainda que não existisse Deus, ou mesmo que ele não cuidasse das coisas humanas: Et haec quidem, quae jam diximus, locum aliquem haberent, etiamsi daremus, quod sine summo scelere dari nequit, non esse Deum, aut non curari ab eo negotia humana (Proleg. § 11 = "E essas coisas que já afirmamos, também diríamos que existem, mesmo que (o que não poderia ser dito sem grande crime) não existisse Deus, ou não cuidasse ele das coisas humanas").

Convém advertir que essa fórmula, conquanto típica do sistema de Grócio e a ele ordinariamente atribuída, não teve, porém, nele, a sua origem. Suarez (De legibus ac deo legislatore, Lib. n, Capo CVI, § 3°) acena para vários autores que, em suas disputas teológicas, usaram semelhantes expressões: em especial Gregorius, que não é, aqui, o Gregório de Valença, do século XVI (como alguém entendeu), nem mesmo Gregório de Rimini (Ariminensis, ou de Arimino, morto em 1358), no qual, de fato, lemos: Nam si per impossibile ratio divina sive Deus ipse non esset, aut ratio illa esset errans, adhuc si quis ageret contra rectam rationem angelicam vel humanam aut aliam aliquam si qua esset; peccaret (= "Pois, se por impossível, não existisse a razão divina, ou o próprio Deus, ou fosse titubeante aquela razão, se mesmo assim, agisse contra a reta razão, Angélica ou humana, ou contra outra razão qualquer, pecaria") - (Super secundo Sententiarum, Distinctio XXXIV, quaestio 1, art. 2). Certamente por engano, Gierke, na sua excelente obra J. Althusius und die Entwicklung der narurrechtlichen Staatstheorien (3. Aug., 1913, p. 74), atribuiu essas palavras ao alemão Gabriel Biel (morto em 1495), o qual as escreveu, mas reportando-as a Gregório de Rimini, que não deixa de citar (cf. BIEL. Epítome et collectorium ex Occamo super auatuor libros sententiarum, 1495, edição também com o título Commentarii in IV Sententiarum libros, Brixiae, 1574, L. II. Dist. XXXIV, questão única, art. 1). As disquisições teológicas desses e de outros escritores tiraram motivo de uma doutrina de Hugo de S. Victor (De sacramentis Christianae fidei. L. I. P. VI, Cap. VI-VII. In: MIGNE. Patrologia latina, t. 176). Notáveis são as palavras, com as quais Suarez retoma (sem, porém, aprová-las) as teses dos autores acima referidos: Licet Deus non esset, vel non uteretur ratione, vel non recte de rebus judicaret, si in homine esset idem dictamen rectae rationis dictantis, v. g. malum esse mentiri, illud habituum eamdem rationem legis, quam nunc habel; quia esset lex ostensiva malitiae, quae in objecto ab intrínseco existit = "Ainda que Deus não existisse, ou não usasse a razão, ou não julgasse retamente a respeito das coisas, se no homem existisse um ditame da reta razão que dissesse, por exemplo, ser mau mentir, aquele ditame teria a mesma razão da lei que tem agora, porque a lei seria ostensiva da maldade que existe intrinsecamente no objeto" (loc. cit.). Suarez foi, sem dúvida, a fonte próxima, à qual chegou Grócio.


Como se conhece o direito natural? Grócio indica dois métodos: um, a priori, mais sutil e filosófico; o outro, a posteriori, acessível a todos, mais popular.
Conhece-se a priori quando se encontra a necessária conformidade ou desconformidade de uma certa coisa com respeito à natureza racional e social.
Conhece-se a posteriori quando se vê que alguma coisa é crida como justa por todos os povos mais civilizados. Mas, admite o próprio Grócio, este segundo método é imperfeito, e tem valor apenas de probabilidade. Na verdade, ele exigiria, antes de tudo, o conhecimento do direito positivo de todos os povos, e mais (e esta é a objeção capital), o direito natural deve valer propriamente por si mesmo, ainda se violado ou desconhecido.
Entre as condições de sociabilidade, que constituem o direito, Grócio destaca nelas especialmente uma, a inviolabilidade dos pactos. Se admitíssemos que fosse lícito faltar aos pactos, a sociedade não seria possível. Deinde vero cum juris naturae sit stare pactis, ab hoc ipso fonte jura civilia fluxerunt (= "Na verdade, como é do direito natural que os pactos são estáveis, dessa mesma fonte decorreram os direitos civis" - Proleg., § 15).
Partindo desse princípio, Grócio deduz do mesmo a legitimidade dos governos e a inviolabilidade dos tratados internacionais. Supõe, de fato, que o Estado, a organização política, seja constituído por força de um pacto. Portanto, também Grócio é um contratualista, isto é, segue a teoria do contrato social, mas em um sentido que podemos dizer empírico.
Outros escritores, anteriores e posteriores a Grócio, buscam estabelecer um tipo ideal de contrato. Tinham eles compreensão, mais ou menos explicitamente, de que o contrato é uma idéia, uma hipótese, um princípio regulador mas não um fato histórico; este reconhecimento realça o desenvolvimento progressivo da teoria.
Ao contrário, para Grócio, o contrato social teria acontecido, ou seja, representaria uma verdade histórica. Por conseqüência, não existe um contrato social único, mas existem tantos deles, e diferentes, quantas e quais sejam as constituições políticas existentes.
Grócio supõe que toda constituição positiva possa ter sido precedida de um contrato correspondente, o que tornaria legítimas todas as instituições, todos os governos. Sicut autem multa sunt vivendi genera, alterum altero praestantius, et cuique liberum est ex tot generibus id eligere, quod ipsi placet, ita et populus eligere potest qualem vult gubrnationis formam, neque ex praestantia huius, aut illius formae, qua de re diversa diverso rum sunt judicia, se ex voluntate jus metiendum est (= "Assim como são muitos os modos de vida, um mais valioso do que o outro, e cada um é livre para escolher entre todos o que lhe agrade, da mesma forma, o povo pode escolher a forma de governo que deseja, não pelo valor dele, ou de sua forma, a respeito da qual os juízos são diversos, mas esse direito deve ser medido pela vontade"). (Lib. I, cap. III, § 8.)
O contrato social é, então, para Grócio, um ato exterior, uma manifestação que deriva da opinião e de uma certa oportunidade do momento, não já da natureza própria do homem. Só o impulso à sociabilidade derivaria, para o homem, da natureza; mas a forma que a sociedade deve assumir, seria deixada ao seu mero arbítrio.
Grócio inclina-se a combater a opinião (manifestada pouco antes, por exemplo, por Althusius) segundo a qual os povos teriam sempre o direito de chamar para si a soberania originária. Atque hoc primum rejicienda est eorum opinio, qui ubique, et sine exceptione summam potestatem esse volunt populi, ita ut ei reges, quoties suo imperio male utuntur, et coercere et punire liceat" (ib.) (= "Em primeiro lugar deve ser rejeitada a opinião daqueles que, sempre e sem exceção, querem que o poder do Povo seja o maior, de tal modo que a ele seja lícito coagir e punir os reis sempre que usem maIo poder").
Por isso ele, à guisa de postulado, declara que juris naturae est stare pactis (= "É da natureza do direito que os pactos se mantenham").
A idéia do contrato social é colocada por Grócio apenas para demonstrar no povo a obrigação perpétua da obediência ao soberano. Desta maneira, o contrato social é como uma praesumptio juris et de jure, pela qual os atos praticados pelos governantes entendem-se consentidos pelos súditos.
Entendida neste sentido empírico e irracional, a teoria contratualística merece as várias objeções que lhe são feitas. Tais objeções, todavia, não têm valor contra os sistemas, nos quais o contrato social é entendido, mas como fato empírico, como princípio racional regulativo. Podem, antes de tudo, opor-se às teses de Grócio as constatações históricas, que demonstram que a sociedade e o Estado não tiveram origem no contrato, mas são fatos naturais, produzidos independentemente da reflexão e da deliberada vontade. O caráter consensual prevalece apenas enquanto a vida da sociedade progride; já o exercício e o reconhecimento jurídico da autonomia de cada um sucedem gradativamente à primitiva solidariedade impessoal dos grupos.
Poder-se-ia ainda indagar a Grócio por qual razão, dado que um pacto tivesse mesmo sido conluído originariamente, devesse obrigar as gerações seguintes, sem que elas tenham contratado ex novo aquele vínculo. Ademais, seria necessário verificar a liberdade do consenso e examinar se o conteúdo do contrato é lícito ou não. A razão nos diz que um contrato é obrigatório apenas se for concluído por deliberação espontânea, ou pelo menos fora de imediata violência.
O caso de um povo que, derrotado na guerra, in periculum vitae adductus, ou inopia pressus (como diz Grócio), renda-se incondicionalmente em escravidão a outro povo ou uni homini praepotenti, pode constituir entre as duas partes uma transação de fato, não de direito. Enfim, é de advertir-se que, em certos casos, o conteúdo do pretenso contrato pode ser de maneira a excluir por si que o consenso tenha sido livre, e assim, válido.
Assim, quando se apresenta como conteúdo de um contrato a alienação total, feita, por um dos contratantes, de tudo o que ele é e tem, sem qualquer correspondência da outra parte, poderíamos afirmar, a priori, sem receio de erro, que tal contrato, mesmo que concluído, é nulo em face do direito. Mas Grócio, atento apenas em estabelecer a obrigação de obediência dos súditos, atribuiu valor absoluto ao pretendido fato do contrato social (que como tal é inexistente). A hipótese contratualística não tem, pois, no seu sistema, valor racional, mas representa apenas um expediente ou uma fórmula fictícia para sanar e ratificar o que se encontra já realizado.
A teoria de Grócio é, quiçá, mais fecunda quando se aplica aos tratados internacionais. Ele quer introduzir a idéia do direito nas relações entre os Estados, e demonstrar que os tratados concluídos entre os Estados têm validade jurídica, são obrigatórios por direito natural. Desenvolvendo esse conceito, Grócio promoveu o desenvolvimento do direito internacional, em um tempo no qual a sociedade dos Estados apenas se preparava para formar-se, depois da decadência do poder medieval.
Além daquele princípio geral, Grócio propõe várias normas especiais sobre o estado de paz e de guerra, preparando algumas reformas nos usos dos beligerantes e formulando temperamentos que, em parte, vieram a ser aceitos.
Segundo as regras do direito internacional, a guerra tornar-se-ia quase um instituto jurídico, embora não perfeito, certamente. A isso, na verdade, tendia o trabalho de Grócio. Em seu tratado, porém, ele vale-se sobretudo de exemplos históricos, de tal modo que se transformou em uma exposição mais de fatos que de princípios.
A tendência moderna é no sentido de não reconhecer em Grócio um grande valor especulativo. Mas é indubitável a influência que ele teve em seu tempo, tanto que foi geralmente proclamado o fundador do direito internacional (embora isto não seja exato); e como tal foi considerado pelos estudiosos, e talvez também pelos governos. Vico o chamou "o jurisconsulto do gênero humano".
Entre as numerosas elaborações e discussões sobre a obra de Grócio, recordemos o escrito do alemão Enrico Cocceji (1644/1719), Grotius illustratus, que foi completado e publicado (com notáveis acréscimos) por seu filho, Samuel Cocceji (1679/1755). Pode-se ainda recordar a tradução francesa do De jure belli ac pacis, acompanhada de valiosas notas, de 1. Barbevrac (1674/1744), nascido na França, professor em Losana e em Groninga), que traduziu e comentou igualmente também a obra de Pufendorf.
Não faltaram a Grócio, mesmo em seu tempo, críticas e oposições. Uma célebre polêmica desenvolveu-se a propósito da liberdade dos mares, que Grócio (em vista dos interesses holandeses) tinha defendido com a monografia intitulada Mare liberum (1609). Contra a tese de Grócio surgiram numerosos opositores, especialmente na península ibérica e na Inglaterra.
Recordemos, entre os mais notáveis, o monge português, professor na Espanha (em Valladolid), Serafino de Freitas (De justo imperio Lusitanorum asiatico adversus Grotii Mare liberum, 1625) e o inglês João Selden (1584/1654), Mare clausum, seu de dominio maris, 1635). Com esta monografia, tornada famosa ao lado da de Grócio, Selden propôs-se, antes de tudo, a demonstrar que, por direito natural, o mar não é comum a todos os homens, e, assim, pode ser objeto de domínio privado e político. Daí sustentou particularmente os direitos do rei da Inglaterra sobre os mares que circundam o Império Britânico.
Mais ainda que por esta dissertação, Selden merece menção pela sua maior obra, De jure naturali et gentium juxta disciplinam Ebraerum (1640), a qual representa uma singular tentativa de construir um sistema de direito natural sobre as bases dos preceitos divinos, que teriam sido revelados aos hebreus, e por meio deles a outras nações (proibição da idolatria, da blasfêmia, do homicídio, do adultério, do incesto, do furto, etc.). A obra de Selden foi profundamente estudada e discutida por Vico, ao lado das de Grócio e de Pufendorf, sendo justamente esses autores estimados por ele "os três príncipes do direito natural das gentes."

quarta-feira, 7 de julho de 2010

A Filosofia do Direito na Era Moderna

Sumário: 1. Maquiavel e Bodin. 2. Grócio e outros escritores de seu tempo. 3. Hobbes. 4. Espinosa. 5. Pufendorf. 6. Locke e outros escritores ingleses. 7. Leibniz, Thomasius e Wolf. 8. Vico e Montesquieu. 9. Rousseau e a Revolução Francesa. 10. Kant. 11. Fichte e a escola do direito racional. 12. O historicismo. 13. O historicismo filosófico, ou idealismo objetivo (Schelling, Hegel). 14. O historicismo político, ou a Filosofia da Restauração. 15. O historicismo jurídico, ou a escola histórica do direito. 16. Referência bibliográfica.

1. Maquiavel e Bodin

Nicolau Maquiavel (1469/1527), homem mais político que filósofo, foi um dos primeiros a tratar a ciência política com o espírito dos novos tempos, fundando-se na observação histórica e psicológica, distanciado de qualquer preocupação dogmática. Foi principalmente um homem de ação. Só quando se retirou dos afazeres de Estado para a vida privada compôs suas principais obras, entre as quais se destacam O Príncipe (Il Principe, de 1513) e os Discursos sobre a Primeira Década de Tito Lívio (Discorsi sopra ia prima Deca de Tito Livio).
Maquiavel indaga-se quais as causas que asseguram a estabilidade de um governo, e como tirar proveito a esse respeito da história antiga, analisando os critérios de governo dos Romanos, extraídos da narrativa de Tito Lívio.
Maquiavel examina os homens como são, com suas paixões, com seus vícios em geral, estuda as condições de fato, às quais se refere. Todavia, mirando o quadro desolador da Itália dilacerada por vários dominadores, é levado a conceber o ideal da unidade pátria. Segue, no entanto, sempre, o método da indução e da observação histórica. Ciente das reais condições de seu tempo, mesmo naquilo que elas tinham de mais triste, indaga como se possa tirar proveito delas para chegar à formulação de um Estado Itálico independente.
Sem nenhuma preocupação moral, indica os meios que estima como mais eficazes e aptos ao fim visado. Em certos casos não tem dúvida em aconselhar ao Príncipe que queira garantir o domínio da Itália, a fraude, além da violência. Tais meios eram comumente usados em seu tempo, mas o fato de ele os aconselhar lançou uma sombra sobre o seu nome e sua obra. Maquiavelismo tem, em política, um triste significado e resume-se na conhecida fórmula: o fim justifica os meios.
Alguns, como Alberico Gentili, Rousseau, Foscolo, etc., entenderam que Maquiavel tivesse querido apenas dar conselhos imorais com ironia, a um Príncipe; e, na realidade, revelar de tal modo os meios adotados na política para, desse modo, resguardar os povos contra as malas-artes dos governantes. Mas essa interpretação de O Príncipe não é a dominante na crítica.
A verdade é que Maquiavel vem julgado e interpretado segundo as condições de seu tempo. A sua justificação, em todo relativa, está nisto: ele tinha um ideal político e calculava quais as reais forças que, na prática, pudesse agregar em dadas circunstâncias, à sua atuação. Em suma, é preciso julgar a sua obra historicamente e em relação a determinado problema político, não como um tratado de moral, que estava distante de seu propósito. Queria apenas ensinar como tinha podido, então, formar-se um Estado Nacional na Itália (analogamente ao que ocorreu na França e na Inglaterra). Queria, em especial, exortar um Príncipe, ao qual as suas palavras eram endereçadas, a tomar uma iniciativa para esse fim.
O livro O Príncipe não é, pois, como se chegou a acreditar, uma sátira contra a tirania, mas um programa para a transformação da Itália em um Estado unitário.
Convém também advertir que, mesmo sob o aspecto prático e político, Maquiavel não avaliou adequadamente a eficácia dos fatores morais. Apenas se referiu aos motivos mais baixos da natureza humana, mas com eles não se fundam nem se regeneram as nações.
Os próprios fatos mostram que a Itália permaneceu dividida e em grande parte escrava, ainda, por três séculos, não obstante os meios sugeridos por Maquiavel; e só renasceu para a unidade estatal por intermédio de um mais elevado programa moral, ensinado pelos pensadores e mártires do final do século XVIII e primeira metade do XIX.
Outro escritor de transição digno de ser lembrado é o francês Giovanni Bodin (1530/1596), autor da obra Da República (De la République), em seis livros (1577, depois traduzido pelo próprio autor para o latim, em 1586).
Bodin trata da organização do Estado com método racional, não dogmático; é, por isso, um dos precursores da nova ciência política.
Não obstante algumas diferenças, pode ser confrontado com Maquiavel por várias razões: também ele funda-se sobre a observação dos fatos e se propõe fins concretos, imediatos; também ele, como Maquiavel, é absolutista; sua obra corresponde à consolidação da Monarquia na França.
A parte mais importante de sua obra é a que se refere à soberania. O conceito de soberania não podia ser bem definido na Idade Média, porque a ele se associavam elementos estranhos, especialmente teocráticos. (Considerava-se o soberano como representante da divindade. De outra parte, no feudalismo, a soberania política confundia-se com o direito privado de propriedade.)
Bodin afirma que em todo Estado deve existir um poder supremo, uno e indivisível (não há Estado sem poder soberano). São caracteres essenciais da soberania o absolutismo e a perpetuidade. A soberania compreende, em primeiro lugar, o direito de fazer leis. Mas aquele que faz as leis, segundo Bodin, não pode a elas estar sujeito; permanece, assim, superior a elas. O soberano está sujeito apenas às leis divinas e naturais, cujo império reafirma. Na ordem jurídica positiva, a soberania é necessariamente absoluta: aquele que é dela investido é superior à lei, e para com o soberano existem deveres, e não direitos. Assim, nenhum direito à rebelião contra o tirano (como sustentado por algumas escolas); e, da mesma forma, nenhum direito do cidadão contra o Estado. A liberdade é, desta forma, sacrificada à autonomia estatal.
Observamos que essa concepção de Bodin é imperfeita, porque põe em destaque o caráter de independência extrínseca do poder soberano; não assinala, por outro lado, a possibilidade de uma intrínseca limitação desse poder, com o objetivo de dar lugar a uma tutela jurídica da liberdade individual. Mas a solução desse elevado problema, do qual depende o surgimento do Estado constitucional, devia estar reservada a uma época posterior.
A soberania, com todos os seus caracteres próprios, pode pertencer, segundo Bodin, tanto a um monarca como ao povo, ou a um corpo de nobres. É claro que, com isso, Bodin (contrariamente a quanto foi considerado depois, por exemplo, por Roussseau) confunde a soberania com o governo.
Distingue, portanto, três formas de soberania ou de governo: monarquia, aristocracia e democracia.
Enquanto, segundo alguns (Aristóteles, Políbio, Cícero, Maquiavel) podia-se ter também uma forma mista de governo, Bodin refuta essa teoria, a qual, ao seu ver, contrasta com o conceito fundamental de soberania, que é essencialmente indivisível.
Assim, aqui e ali será preciso examinar a quem compete fazer as leis (primeiro distintivo da soberania). Quando no fazer a lei existe parte essencial, por exemplo, o povo, o governo é democrático; e assim por diante.
Bodin examina, depois, as vantagens de cada uma dessas formas de governo e conclui pela excelência do governo monárquico (como existia na França). Para Bodin, a soberania, que é una por natureza, encontra na monarquia a sua natural expressão.
Como Maquiavel, Bodin é, antes de tudo, um político, e em seus tratados visa sempre a política. Considera, portanto, com particular zelo, as causas de mudança do governo e busca condições melhores para o desenvolvimento do Estado, afirma a oportunidade de adaptar as leis às condições naturais (insistindo, por exemplo, na relação entre o clima e as leis). Inspirou, nessa parte, a Montesquieu.
A obra de Bodin é também uma fonte de estudos especiais: assim, por exemplo, sobre impostos, em que é considerado dos primeiros cameralistas (cultores da ciência cameral, que corresponde à hodierna ciência das finanças).
Bodin defendeu, ainda, a tolerância religiosa, diante das violentas lutas que se feriram então entre católicos e protestantes. Por essas e outras manifestações, mostra-se um iniciador da idade moderna, enquanto que, por outros aspectos, conserva, ainda, caráter medieval (por exemplo, ele escreveu ao influxo de demônios e de astros, etc.).
fonte: s.n.t.

terça-feira, 6 de julho de 2010

O GAROTO QUE FUGIA DA FILOSOFIA

O garoto que fugia da filosofia

Quando eu era criança me veio o temor de eu não enxergar a mesma cor, que eu denominava verde, que a cor que outros denominavam também de verde. Dávamos o adjetivo “ verde” a um objeto que tinha a cor verde. Concordávamos: aquilo que apontávamos era verde. Mas, será que o “meu verde” era o mesmo que o “verde do outro”? Eu era um filósofo e não sabia. Eu cresci um pouco e achei que perguntas desse tipo não eram sérias, e que era coisa de criança. Quis largar a filosofia, e isso antes mesmo de chegar à adolescência.

Fiquei contente em perceber que a pergunta sobre o verde havia ficado no passado. Estava livre da filosofia! Ah, que bom! Nada de perguntas malucas, que poderiam me atrapalhar não só no esporte, mas também no namoro. Um filósofo não joga bola e ninguém quer namorar um filósofo – assim diziam e assim acreditei. Além disso, perguntas daquele tipo, que até sobreviveram comigo no tempo da escola primária, não tinham trazido pouco dissabor para minha vida em sala de aula. Ah! Livre delas, terminado o tempo da filosofia, eu poderia, enfim, ser normal!

Jogando bola e namorando, tudo iria bem. Os problemas existiam, mas eram outros. No esporte, a questão era a da estratégia no basquetebol. Como fazer o adversário pensar uma coisa que não se iria fazer e, assim, levá-lo a deixar que fosse feito o que eu realmente pretendia. Finta – eis aí o nome da coisa. No namoro, a questão às vezes era parecida, quase como a do basquetebol: as meninas da mesma idade, já bem mais maduras, queriam os moços, os mais velhos, e quando vinham para namorar com garotos, também fintavam: faziam que estavam apaixonadas e nós acreditávamos, mas não estavam. Nesse caso, não era finta o nome que dávamos, era traição. Como nos mordíamos com isso!

Um dia voltei à biblioteca do meu avô, que eu havia abandonado na pré-adolescência. Quando vi estava com um livro de filosofia nas mãos. Ele falava de ética e moral, e eis que os problemas da finta e da traição estavam lá. Enganar, dissimular, trair, divulgar ideologia etc. – tudo lá. Eu pensava ter me livrado da filosofia! Mas ela estava novamente comigo.

Resolvi, então, enfiar a cabeça nos estudos das “matérias principais” Chega de só namorar, só jogar bola e, é claro, chega de resvalar em filosofia. Uma vida normal – eis o que eu queria. Uma vida normal implicava em ter uma profissão. Então, deveria passar no vestibular, fazer universidade e ganhar o chamado mercado de trabalho.

Comecei a estudar matemática para valer. Mas, rapidamente, as coisas ficaram complicadas. Eu havia aprendido bem o Teorema de Pitágoras. E já o havia aplicado à diagonal de um quadrado de lado unitário. Mas, um pouco mais velho, essa operação fez novo sentido para mim. O resultado: raiz quadrada de dois. Ora, mas essa raiz não dá um número que eu possa determinar e, no entanto, estou vendo ali que a diagonal tem começo e fim, tem de ter um número finito determinável. O cálculo mostra uma coisa, a visão mostra outro. Como? Quem estaria certo: o intelecto que aplicou o Teorema ou os olhos que não concordam com o resultado da aplicação? Não foi nem preciso eu voltar à biblioteca do meu avô para ver que estava eu, novamente, envolto com algo que não era só da ordem da matemática, mas da filosofia.

Não podendo vencer o inimigo, tratei de me unir a ele. Aceitei a filosofia como a companheira que iria fazer parte da minha vida. Mas, quando vi, ela era toda a minha vida. Eu já não era nada a não ser filósofo. E eis que me peguei com todos os problemas que citei antes, em níveis diferentes. E então vi que isso dependia de conversa, debate, vida pública, fala com outros. E que isso era possível em um lugar com liberdade. Para ser filósofo, para ser eu mesmo, precisava de liberdade. E aí fui eu pela vida, filosofando e buscando a liberdade. Buscando a liberdade e filosofando.

Ah, o basquete? O tempo tornou as pernas duras. Ah, as mulheres? Gostei bastante e ainda gosto, obrigado! Tenho a melhor delas.

Paulo Ghiraldelli Jr, filósofo.


Fonte: http://portal.filosofia.pro.br/

HISTÓRIA DA FILOSOFIA

I. A GRÉCIA
1) O berço da Filosofia. A Grécia e o mundo grego.
Localizada entre o Oriente Asiático e a Europa Ocidental, os gregos – dotados de instituições sociais e políticas que incentivavam a iniciativa individual – recolhem as matérias das grandes civilizações e com espírito sintético e artístico elevou este monumento de cultura, copiado por muitos até hoje. Os gregos fundaram muitas cidades Estado e os cidadãos livres podiam se dedicar a política e a cultura, já que os escravos cuidavam de todo trabalho braçal.
2) Condições históricas, econômicas, políticas e religiosas da Grécia no surgimento da Filosofia.
Enquanto a Filosofia nascia a Grécia passava por transformações profundas resultantes da retomada do comércio com o Oriente o que ocasionou uma efervescência religiosa e social. Nesse processo libertou-se o espírito humano que passou a procurar uma resposta racional para os acontecimentos

II. O MITO
3) A primeira tentativa de busca de compreensão do mundo: o mito.
O ser humano desde tempos remotos preocupou-se com as coisas ao seu redor. A primeira tentativa de busca da compreensão do mundo foi o MITO. Os gregos explicavam os fenômenos naturais, através do sobrenatural, eles atribuíam aos deuses todos processos que ocorriam na natureza. Quando Homero e Hesíodo colocar o MITO no papel, surgiram as primeiras críticas ao MITO.
4) A idéia de physis e sus importância para a passagem do pensamento mítico ao pensamento filosófico ou científico. Da arché ao logos.
Com a physis (natureza), os homens deixam de procurar as causas dos fenômenos naturais no mundo sobrenatural e passou a buscar as causas dos fenômenos naturais, no próprio mundo natural. A fim de evitar a regressão ao infinito da explicação causal, pois sempre existe possibilidade de buscar uma causa anterior, os filósofos tentam buscar um elemento primordial, a arché, um ponto de partida para todo o processo. Logos = discurso. O logos é o discurso dos primeiros filósofos, que explica o real por meio de causas naturais.
5) Arché e physis: esquemas mentais para compreender e explicar a realidade.
PHÝSIS: explicava a realidade dentro da própria realidade, a natureza era explicada dentro da própria natureza, sem recorrer a fatores sobrenaturais como era feito no Mito.
ARCHÉ: Se todo fenômeno natural tem uma causa que é natural, essa relação de causalidade leva ao infinito, pois sempre existe possibilidade de buscar uma causa anterior. Para resolver este problema de causalidade infinita, surge a ARCHÉ, que é o elemento primordial, que serve de ponto para todo o processo.
6) Pensamento mítico e pensamento científico.
Pensamento Mítico: tenta explicar os fenômenos naturais, buscando a causa dentro do mundo fenomênico.
Pensamento Científico: explica os fenômenos naturais, buscando a causa dentro da própria natureza, da própria realidade.

III. O SURGIMENTO DA FILOSOFIA
7) Revolução grega ou milagre grego. O fato. As conseqüências. A interpretação.
Alguns recusam ver na nascente filosofia grega uma ruptura súbita com o mito, à semelhança de um milagre. A física jônia mais se aproxima de uma construção mítica e nada lembra s ciência como a conhecemos. Como o Mito, a física jônia não procurou as leis naturais. As antigas divindades embora recusadas nominalmente, estão presentes como forças ativas, sentidas como divinas. De qualquer modo porém, não há continuidade entre mito e a filosofia na Grécia. Ocorreu realmente profunda ruptura no pensamento grego. O importante é afirmar que algo de novo e muito importante aconteceu.

IV. A FILOSOFIA GREGA
8) Conhecimento sensível e conhecimento racional (dóxa: aparência, opinião), conhecimento sensível, e alethéia (verdade, certeza), conhecimento racional. Os gregos tiveram dificuldade em conciliar os dois até Aristóteles.
DÓXA: conhecimento sensível, aparência, opinião. Para os antigos gregos ele era incerto
ALETHÉIA: conhecimento racional, verdade, certeza. Para os antigos gregos a razão não engana.
A única maneira de se criar conceitos é através da análise e abstração do que o mundo nos oferece. Os sentidos são os nossos únicos meios de conexão com o mundo exterior. Os gregos tinham dificuldade de conciliar os dois, pois não conseguiam unir estes dois conceitos, não sabiam estabelecer a conexão entre eles. Aristóteles conseguiu. Aristóteles: “nada existe na mente que não tenha passado antes pelos sentidos”.
10) O problema não solucionado da relação entre ser e movimento.
Para os gregos o movimento tinha outro sentido.
Movimento para os gregos:
Físico: mudança de lugar dos corpos no espaço físico.
Quantitativo: aumento e diminuição na quantidade dos corpos.
Qualitativo: alteração nas qualidades ou características dos corpos
Substancial: geração e corrupção dos corpos.
O universo apresenta dois aspectos:
Aspecto dinâmico: o movimento (no sentido grego), atestado pelos sentidos, afirmado pelo senso-comum.
Aspecto estático: caráter absoluto do ser.
Os gregos não conseguiram conciliá-los. Aristóteles não conseguiu

11) Movimentos da filosofia grega: centrípeta, cêntrica e centrífuga:
CENTRÍPETA: veio de outras regiões da Grécia em direção para Atenas. Período pressocrático.
CÊNTRICA: já esta na Grécia. Período Socrático.
CENTRÍFUGA: sai de Atenas e vai em direção às outras regiões. Período possocrático

12) A política para os gregos era parte da ética. Foi Maquiavel ( Século XV E.C) quem separou política e ética, tornando a política um conhecimento específico e autônomo (uma ciência). Conseqüências dessa separação.
A política para Platão não é uma ciência, é Ética. Para ele, o fim do Estado é tornar o indivíduo feliz, facilitando-lhe a prática da virtude. Ele acreditava que as ações do Estado deveriam orientar-se por valores de conduta, por preceitos que exprimem os desejos do homem e o ideal de virtude. Com Maquiavel, a política se separa da ética e se torna uma ciência. Ele justificava o uso dos meios da mentira, da dissimulação, da violência e da fraude pelo exercício do governo. Com esses pensamentos Maquiavel rompeu com o pensamento de que as ações do Estado deveriam orientar-se por princípios morais determinados, tornando a política um conhecimento específico e autônomo (uma ciência).